Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças (Eternal Sunshine of The Spotless Mind – 2004)
Na Grécia antiga, berço da filosofia, Heráclito afirmava metaforicamente que nunca nos banhamos duas vezes no mesmo rio. O existir é um perpétuo mudar, um constante fluir. Já Parmênides de Eleia (povo pioneiro no uso da dialética) contestava-o afirmando que o ser é único, eterno, imutável, imóvel e infinito. Ele dividia o mundo em sensível (aquele que conhecemos pelos sentidos) e inteligível (mundo que não vemos e não tocamos, mas compreendemos).
John Locke argumentava que a identidade do ser não era definida por características físicas, mas, sim, por repetida autoidentificação. Logo, a memória torna-se essencial na construção do ser. O que aconteceria caso o homem pudesse manipulá-la, de forma a aniquilar elementos que o fizeram tornar-se quem ele é? Apagar da mente aqueles eventos que ajudaram a construir sua personalidade, afetaria a forma como o ser lidaria com o seu habitat?
O filme, dirigido por Michael Gondry, abre esta importante discussão, contando a história do casal Joel (Jim Carrey) e Clementine (Kate Winslet). Após anos sentindo-se insatisfeita com os rumos do relacionamento, ela age impulsivamente e aceita participar de um tratamento que irá fazê-la “cirurgicamente” esquecer completamente de seu namorado. Indignado, Joel decide fazer o mesmo, porém acaba percebendo o valor da preservação daqueles momentos.
Ele lutará até o fim para manter suas recordações, mesmo aquelas que causam sofrimento, pois também ajudaram a construir o homem que ele se tornou. O roteiro brilhante de Charlie Kaufman nos induz a questionar a nossa frágil psique, com a angústia de alguém em lidar com a indiferença do outro. Apaga-se a memória, mas ele ainda existe.
O ser humano não busca na pessoa amada aquela que dará consistência a si próprio, mas sim uma projeção ilusória do que consideramos ser a perfeição. A partir do momento em que a pessoa amada não mais consegue manter aquela imagem idealizada, o que ocorre naturalmente em curto espaço de tempo, nasce o sentimento da frustração e o desejo de terminar aquele relacionamento e buscar a ambicionada “perfeição” em outra pessoa. Esquece-se que os contrastes não são defeitos, mas, sim, características marcantes que nos diferenciam.
A “perfeição” nasce quando a mente madura (independe de idade) percebe que o amor é uma comunhão harmônica entre contrastes. Joel percebe isto enquanto realiza seu tratamento. Ele é apaixonado exatamente pelas características mais dissonantes da personalidade dela, suas fascinantes idiossincrasias. Todos os aspectos que antes considerava determinantes para o fracasso da relação, agora se apresentavam com a beleza do desconhecido. Como, por exemplo, aquela mania chata de largar as meias pelo chão ou outros gestos irritantes, que somente ganham em valor quando se perde a pessoa amada.
Somente na ausência é que percebemos a importância das pessoas. No silêncio é que reconhecemos a beleza da música. Joel precisou perder Clementine para perceber o quanto a amava.
Eu facilitei o seu garimpo cultural, selecionando os melhores filmes dentre aqueles títulos que entraram…
Hoje em dia está na moda nas redes sociais estes desafios lúdicos, logo, decidi entrar…
No “Dica do DTC”, a nova seção do “Devo Tudo ao Cinema”, a intenção não…
Eu facilitei o seu garimpo cultural, selecionando os melhores filmes dentre aqueles títulos que entraram…
O cinema já presenteou o público com muitos filmes magníficos no tema, um dos mais…
Eu facilitei o seu garimpo cultural, selecionando os melhores filmes dentre aqueles títulos que entraram…
View Comments
Belo texto. Tocante, emocional, brilhante.
Grato pelo carinho com o meu trabalho, Washington.
Abração!