Raça (Race – 2016)

Stephen Hopkins é um diretor que tem suas raízes no gênero do terror, chamou alguma atenção pela ousadia em “Dangerous Game”, sendo alçado ao mainstream com o injustamente subestimado “A Hora do Pesadelo 5 – O Maior Horror de Freddy”, que merece crédito por ter conseguido resgatar os elementos sombrios de uma franquia que havia se tornado uma grande bobagem. O projeto fracassou nas bilheterias, mas os produtores apostaram nele pra comandar “Predador 2 – A Caçada Continua”. Ele voltaria a ter algum destaque no bom “A Sombra e a Escuridão” e no fraco “Perdidos no Espaço: O Filme”. Ele já havia trabalhado em uma decepcionante cinebiografia, “A Vida e Morte de Peter Sellers”, onde nem mesmo a competência de Geoffrey Rush conseguiu salvar o pobre roteiro, mas é
impressionante a evolução dele em “Raça”, ainda que não reinvente a roda estruturalmente, a narrativa é convencional, mas a execução é correta. Sobre a vida do atleta Jesse Owens, eu recomendo o telefilme “The Jesse Owens Story”, de 1984, superior em alguns aspectos. E, claro, o documentário “Olympia”, de Leni Riefenstahl, sessão obrigatória para qualquer cinéfilo dedicado.

Como introdução básica à história para o grande público, o filme de Hopkins funciona muito bem, fortalecido pelo carisma do protagonista, vivido por Stephan James. Owens abalou as convicções de Hitler nos jogos olímpicos de 1936, um talento natural que só poderia ser ativado por um caráter inabalável, uma lacuna que é preenchida na trama com a relação de cumplicidade que se forma entre ele e seu técnico, vivido por Jason Sudeikis, numa
caracterização muito simpática que facilita ainda mais o investimento emocional do espectador. Enquanto o foco está direcionado à vida do homenageado, todas as decisões são bem sucedidas, o racismo sofrido no próprio seio familiar, o preconceito de seus colegas e até mesmo a inescapável subtrama romântica, tudo soa crível e ajuda a estabelecer a tensão necessária para a catarse do terceiro ato.

O problema começa na composição superficial dos antagonistas no roteiro de Joe Shrapnel e Anna Waterhouse, na maneira simplória com que aborda o conflito político e social, atitude que seria compreensível em um comportado telefilme da década de noventa, mas que incomoda em um projeto tão promissor. O ritmo também se perde no segundo ato, já que é sustentado por coadjuvantes unidimensionais. O tratamento envernizado do caso como apenas uma bonita história de superação no esporte por um underdog, nos dias de hoje, chega a ser revoltante. Até a trilha sonora de Rachel Portman parece mais apropriada para algo tematicamente leve como “Jamaica Abaixo de Zero”, do que para um drama que
ocorre às vésperas do Holocausto nazista.

É uma pena que pouca atenção seja dada à figura de Riefenstahl, que estava acostumada a utilizar o cinema como propaganda e viu-se pela primeira vez com um desafio. Diferente das obras anteriores, em que tudo era controlado pelo comando militar alemão e o próprio Fuhrer, dessa vez suas câmeras iriam documentar um evento livre de qualquer controle, uma celebração de âmbito internacional onde os resultados dependeriam apenas dos atletas. Há uma boa cena dela interagindo com Owens, mas é escrita com mão pesada, com mais interesse no exótico da situação, do que no conflito ideológico.

Talvez a escolha mais acertada tenha sido não se esquivar do tratamento rude que o atleta
continuou recebendo em sua própria nação após a competição, algo mais coerente com a história real, em que o próprio Owens afirmou que havia sido esnobado por Roosevelt, não por Hitler.



Viva você também este sonho...

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