A Um Passo da Morte (The Indian Fighter – 1955)

O primeiro filme da produtora criada por Kirk Douglas, Bryna, nomeada em homenagem à mãe dele, um projeto muito pessoal que fala diretamente aos valores do ator, que optou realizar todas as suas cenas de ação sem a utilização de dublês, com o rigor cênico da direção do competente húngaro André De Toth se destacando em cenas espetaculares como a do ataque ao forte.

O roteiro refinado, com toques de humor e sem gordura extra, de Frank Davis e Ben Hecht, adaptando a história original de Robert L. Richards, que utilizou pseudônimo por fazer parte da lista negra do macartismo, utiliza a trama simples como meio para estabelecer importante humanização da figura do índio norte-americano, elemento essencial na caracterização do protagonista, um homem desprovido de qualquer preconceito, antítese de praticamente todos os heróis dos faroestes de John Ford, que é apaixonado pela índia Onahti, vivida ela bela italiana Elsa Martinelli.

devotudoaocinema.com.br - "A Um Passo da Morte", de André De Toth (texto para catálogo sobre KIRK DOUGLAS)

Johnny Hawks é o guia de uma caravana de pioneiros que viaja para as belas paisagens do Oregon, realçadas inteligentemente na fotografia de Wilfred M. Cline pelo Cinemascope e emolduradas pela trilha sonora de Franz Waxman, um homem justo e íntegro que é escolhido para a tarefa por sua relação de amizade com os Sioux, especialmente com seu chefe, vivido por Eduard Franz, um povo que se orgulhava de um histórico violento de contra-ataque. O problema começa quando os personagens vividos por Walter Matthau e Lon Chaney Jr., dois contrabandistas de bebida que ambicionam o ouro da região, aproveitando a ausência de Johnny, derramam o sangue de um índio.

A ausência que motivou o ódio foi causada pelo amor, metáfora para os riscos de ser guiado apenas pelo emocional. O texto é muito eficiente ao evidenciar o drama da espoliação de suas terras e a exploração dos homens brancos em troca de álcool, uma atitude extremamente corajosa para a indústria da época, que refletia a visão preconceituosa de sua sociedade, quinze anos antes de “Pequeno Grande Homem”, de Arthur Penn.

O discurso de Hawks, alguém avesso à utilização gratuita da violência, para o rancoroso chefe índio no desfecho é poderoso em sua síntese, evocando a necessidade da paz entre os povos para que a próxima geração, a dos filhos resultantes da miscigenação, os frutos da integração, conquistem a real liberdade e, mais que isso, que eles sejam capazes de mantê-la viva a despeito de todos os obstáculos, com a imagem final simbolizando a fragilidade dos seres humanos diante da natureza, o casal sorridente sendo levado pela força da corrente do rio. Por mais valentes que sejamos nas batalhas diárias, não podemos escapar de nossa natureza, nossos ideais, então devemos forjar um caráter sólido, valoroso.

Um bom filme que ainda não ganhou o reconhecimento que merece, sendo usualmente citado apenas pela impecável atuação de Douglas, mérito justo, mas que não supera a mensagem humanista que a trama defende, trabalhada com precisão pelo roteiro.

* Texto escrito para o livro da Mostra “O Último Durão – Centenário Kirk Douglas”, realizada na Cinemateca do MAM (RJ), de 25 de Novembro a 11 de Dezembro.



Viva você também este sonho...

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui