Eu descobri Groucho Marx por acidente, quando tinha 13 anos. Estava na locadora de vídeos na seção de clássicos, enquanto meu pai procurava os lançamentos. Como sempre fazia, escolhia quatro ou oito filmes e voltava correndo para casa, ansioso para começar a maratona. Não lembro exatamente todos os selecionados naquele dia, mas lembro-me que entre eles havia uma comédia clássica de O Gordo e o Magro chamada “Sossega Leão”, mas quando abri o estojo do VHS percebi que a atendente havia trocado (acontecia muito raramente e esta foi a primeira vez) a fita.

A preguiça falou mais alto e eu decidi ver aquele filme, que era dos Irmãos Marx, chamado: “No Tempo da Onça”. Enquanto o humor de Stan Laurel e Oliver Hardy já era presença certa nas minhas maratonas (junto de Chaplin, Keaton e Lloyd), ainda não estava familiarizado com aquele estranho homem de falso bigode pintado (conhecia-o apenas de fama, posto que meu ídolo Woody Allen citava-o várias vezes em seus filmes). Para vocês terem uma ideia do quanto eu gostei da experiência, passadas três semanas, já havia alugado todos os filmes do grupo disponíveis no local.

Eu lembro que meu fanatismo na época foi tão grande que chegava a ver em loop “Os Gênios da Pelota” e “O Diabo a Quatro” (meus favoritos) cerca de três vezes cada, em uma tarde, tomando nota das frases hilárias. Anos depois, já na fase inicial da TV a cabo, passei uma maravilhosa madrugada de réveillon no quarto acompanhando um festival de seus filmes em algum Telecine.

Existem certos artistas que gostamos de prestigiar, mas alguns são tão geniais que sentimos a necessidade de não apenas apreciá-los, como procurar entender como eles pensam e a essência por trás de suas ações. Na época não havia internet e era muito difícil conseguir a mais simples informação, no entanto isto não impedia que eu passasse horas na biblioteca procurando material a respeito deles (ação similar eu tive com Woody Allen e vários outros), sentindo-me Indiana Jones encontrando o Santo Graal, cada vez que conseguia algo novo.

Hoje em dia a informação está acessível ao toque do mouse, mas aquela indescritível sensação de descoberta nunca será obliterada de minha mente.

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Groucho era uma metralhadora anárquica travestida de clown. Sempre tive a certeza de que sua escolha pelo falso bigode (que Chaplin utilizava para parecer mais velho) e forma de andar extravagante era uma gozação com os hipócritas figurões da sociedade da época, uma travessura do mestre na arte do desrespeito elegante (diferente do que muitos humoristas acreditam hoje, o desrespeito pode ser uma ferramenta de crítica muito elegante).

Chico era o “escada”, com seu falso sotaque italiano e jeitão histriônico de galã, que utilizava sempre que sentava-se ao piano. Harpo representava de forma doce e silenciosa (um gênio da pantomima) a criança interior, aquela que brinca inconsequentemente e não sabe escutar um “não”, sempre disposto a ludicamente retrucar com sua buzina qualquer tentativa adulta de domá-lo. Zeppo simbolizava o homem comum, mas incapaz de criar um tipo cômico interessante, acabou saindo do grupo logo após o período nos estúdios Paramount.

O grupo conseguia reunir vários elementos essenciais da comédia (pantomima, ironia verborrágica e pastelão), recebendo o auxílio da presença marcante de Margaret Dumont, uma dama da sociedade sem nenhum senso de humor (ela não entendia as piadas deles na vida real), que se mantinha em cena com Groucho, como uma tora de madeira diante de um machado.

A combinação dos irmãos era explosiva e muito à frente de seu tempo, continuando à espera de ser descoberta pelos jovens que desejarem conhecer a verdadeira comédia, aquela que pode ser afiada como uma lâmina e poderosa em sua crítica, sem precisar utilizar uma palavra de baixo calão. Classe e inteligência eram suficientes.

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A obra deles não está nas plataformas de streaming, mas você encontra com facilidade na internet. Na intenção de facilitar seu garimpo, estes são os meus filmes favoritos do grupo em ordem de preferência:

1 – Os Gênios da Pelota (Horse Feathers – 1932)

Quincy Adams Wagstaff, o novo presidente da Huxley University, contrata os atrapalhados Baravelli e Pinky para ajudar a sua escola a vencer uma grande partida de futebol americano contra sua principal rival, a Darwin University.

2 – Uma Noite na Ópera (A Night at the Opera – 1935)

Os irmãos Marx tocam o negócio de ópera feito doidos quando Otis encontra o ambicioso cantor Ricardo, que está determinado a conquistar o coração de sua colega cantora Rosa. Com a ajuda de Fiorello e Tomasso, Otis tenta unir o jovem casal, mas encontra resistência por parte de Lassparri, que também está de olho em Rosa.

3 – O Diabo a Quatro (Duck Soup – 1933)

Rufus T. Fireflay é um ditador excêntrico que quer ser presidente de Freedonia, um pequeno país que está em crise financeira. Para elegê-lo, a senhora Teadstale promete doar 20 milhões de dólares aos cofres públicos se seu protegido chegar ao poder.

4 – Um Dia nas Corridas (A Day at The Races – 1937)

Um veterinário que se faz passar por médico, o dono de um cavalo de corridas e seus amigos ajudam a proprietária de um sanatório com problemas financeiros, apostando em um cavalo de corridas de futuro pouco promissor.

5 – Os Quatro Batutas (Monkey Business – 1931)

Os irmãos Marx embarcam como passageiros clandestinos em um luxuoso cruzeiro, mas logo são descobertos pelo comandante. Do jeito deles, os quatro vão tentar fugir de todas as autoridades, e acabam se tornando guarda-costas de gangues rivais, o que obviamente vai gerar uma enorme confusão dentro do navio.

6 – Os Galhofeiros (Animal Crackers – 1930)

O famoso Capitão Spaulding acaba de retornar da África. Durante uma festa em sua homenagem na propriedade da Srta. Rittenhouse, um valioso quadro desaparece. O intrépido explorador tentará resolver o crime com a ajuda de seus aliados malucos.

7 – Uma Noite em Casablanca (A Night in Casablanca – 1946)

Logo após a Segunda Guerra Mundial, em Casablanca, Ronald Kornblow (Groucho Marx) é contratado para gerenciar um hotel cujos antigos donos foram eliminados.



Viva você também este sonho...

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