Blade Runner 2049 (2017)
(O texto aborda detalhes da trama, então recomendo que seja lido após a sessão)
O tom e o ritmo deste filme ecoam de forma cristalina o original de Ridley Scott, como é gratificante constatar que Denis Villeneuve corajosamente não fez concessões mercadológicas e verdadeiramente abraçou o espírito da obra de Philip K. Dick, com o roteiro de Hampton Fancher (responsável pelo original) e Michael Green expandindo consideravelmente as discussões propostas, inclusive adaptando conceitos do livro que não haviam sido utilizados, mas, ainda assim, funcionando perfeitamente para aqueles que não viram o anterior.
“Blade Runner 2049” valoriza o peso de cada segundo, as cenas são longas e os diálogos são poucos, a trilha sonora de Hans Zimmer reforça o caos visual que a fotografia de Roger Deakins estabelece logo nos primeiros momentos, um mundo sem sentido e que perdeu humanidade, forçando o espectador a compreender a angústia existencial do protagonista.
A estrutura narrativa não força pontos convencionais de conexão por identificação, há um distanciamento coerente, já que acompanhamos a investigação pelos olhos do personagem de Ryan Gosling, um replicante consciente de que não existe opção contrária às ordens da sua superiora, vivida por Robin Wright. É curioso, apesar da trama não apelar para o sentimentalismo, em sua serenidade, ela entrega um desfecho emocionalmente arrebatador. A razão é simples, não se trata de ficção futurista escapista, o interesse não está em construir um universo franqueado para ser trabalhado em outros projetos, a estética é deslumbrante, os efeitos visuais são espetaculares, mas o que importa fala baixo e diretamente ao coração de todos nós.
Os replicantes fugitivos do original buscavam encontrar o criador e sobreviver, impedir o desligamento, os do novo lutam pela liberdade, a sociedade os limita como cumpridores de tarefas, eles querem ser mais, eles são inspirados pelo sonho que nasce com o milagre, a possibilidade da procriação, a continuidade, o legado. Somos todos replicantes em busca de um sentido para a existência.
A inteligência artificial Joi, vivida pela linda Ana de Armas, irresistível personalidade enquanto holograma, perde todo o encanto ao vivenciar uma experiência física, a satisfação romântica com a ajuda de um avatar não traz tanta ternura, a câmera reforça que é algo puramente mecânico, irrelevante perto da emoção que o simples toque virtual das mãos provocou em uma cena anterior. O sentimento não se reduz à carne, as memórias são muito mais importantes, moldamos carinhosamente as lembranças e buscamos afeto, por conseguinte, tememos a finitude. A sequência magnífica envolvendo artistas de outrora eternizados em hologramas no que restou de Las Vegas representa com inteligência este leitmotiv.
O simbólico origami em formato de unicórnio do original é substituído por um pequeno cavalo de madeira, também trabalhado artesanalmente, mas com uma carga emotiva maior, o presente de um pai, a celebração do lúdico infantil. O elemento que move os personagens principais é a carência, o desejo de pertencer a algo significativo, afinal, não queremos acreditar que a vida é uma breve jornada do pó ao pó. Quando revemos Deckard, melhor atuação de Harrison Ford em muitos anos, encaramos nosso reflexo no espelho, o indivíduo que luta para manter viva a essência, sabendo que todo o resto se perdeu com o tempo. É algo novo que o ator insere, camadas psicológicas que não eram necessárias em sua versão mais jovem.
O roteiro é tão complexo, que faz o original parecer um prólogo charmoso. Se o primeiro tinha mais senso de aventura, no novo o impacto emocional na resolução do conflito principal e as reflexões pós-sessão que ele instiga compensam qualquer problema.
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Incrível como esse comentário sintetiza o que sentimos ao ver a grandiosidade dessa continuação. São tantas as agregações ao sentido da emoção como vida plena que na verdade, como o outro, será preciso assisti-lo muitas vezes para assimilar o que a atenção aos detalhes distraiu a sensação.