Inferno (L’Inferno – 1911)

Ao voltar no tempo para os primórdios desta arte com os irmãos Lumière e a produtora de Thomas Edison, você entende o caráter de puro entretenimento desta ferramenta, que era exibida inicialmente nos Nickelodeons, primitivas saletas em que, por alguns trocados, os frequentadores garantiam poucos minutos de diversão com a exótica novidade da imagem captada em movimento na tela.

Os primeiros cineastas autorais, como Georges Méliès e Alice Guy-Blaché, ousaram inserir o elemento da narrativa, transformando o cinematógrafo em um contador de histórias. Analisando a lenta evolução que ocorreu entre “Viagem à Lua”, de Méliès (1902), e “O Nascimento de Uma Nação”, de D.W. Griffith (1915), existe uma obra italiana pouco lembrada, apesar de ter sido um sucesso nas bilheterias da época: “Inferno”, dirigida por Francesco Bertolini, Adolfo Padovan e Giuseppe de Liguoro, adaptando a primeira parte de “A Divina Comédia”, de Dante Alighieri, com forte inspiração nas pinturas de Gustave Doré.

É surpreendente o escopo épico, não apenas da ambiciosa pretensão artística da obra, mas também de sua execução, nos elaborados figurinos e na composição das cenas. O posicionamento da câmera, como era usual no período, remete à linguagem teatral, algo que reforça a reverência ao material literário, dando um caráter mais adulto ao que, até então, ainda era visto como bobagem juvenil.

As filmagens levaram mais de três anos, o hercúleo esforço dos três diretores é visível em sequências como aquela que mostra Dante e Virgílio se aproximando do rio Aqueronte, com dezenas de corpos nus tentando embarcar na balsa de Caronte, que os afasta com seu remo. Não há nada realizado pelo cinema até aquele momento que se compare com a complexidade das imagens desta obra, que, inclusive faz uso pioneiro dos flashbacks na trama.

Alguns truques visuais de Méliès são utilizados, mas a proposta é completamente diferente, o interesse é evidenciar o horror daquela realidade, o clima é de constante pesadelo. Se tivesse sido feita nos Estados Unidos, seria abraçada hoje internacionalmente pelos acadêmicos como uma obra-prima, não estaria limitada ao interesse arqueológico dos cinéfilos mais dedicados.



Viva você também este sonho...

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